terça-feira, dezembro 08, 2015

Roll

Nem todo tango é argentino
Nem todo fado é lusitano
Nem todo blues veio da África
Nem todo flamenco é cigano
Nem todo samba é brasileiro
Nem todo rock é marciano

terça-feira, agosto 11, 2015

Cada um faz a sua parte


Rio Branco está parada. Todo mundo parou em solidariedade aos professores. Só quem se move é o Sindicato e os voluntários que colaboram no esforço de greve. A cozinha n’O Casarão não descansa no fornecimento de marmitas, cujos ingredientes vêm de todo lado: do comércio local, das hortas domésticas e até das doações da última enchente, que estavam estocadas não se sabe por quê. Eu estava indo a pé para o centro, pois os ônibus não prestavam o serviço essencial já que ninguém ia para o trabalho e os poucos que rodavam era para levar professores para a manifestação em frente ao palácio do governo, que estava em pulgas e não conseguia dormir desde que anunciou que cortaria o ponto dos faltosos e mandaria embora os de contrato provisório, o que fez com que toda a sociedade se manifestasse, começando pelos estudantes, passando pela polícia que cruzou os braços e chegando até aos hospitais, onde os médicos só tratavam os casos mais urgentes, muitos causados pelo sol e o fumo das queimadas, os únicos elementos que não aderiram ao manifesto e continuavam a maltratar a multidão que aguardava o comunicado do porta voz governamental. Eu não via a hora de ver a cara do governador. Andava o mais rápido que podia sob o calor e a fumaça... Ia todo contente... Aí, o menino Juan abriu a porta do quarto e eu acordei... tossindo e todo suado.

Foto: Everton Damasceno/ContilNet

sábado, julho 18, 2015

Síntese


Então, a Grande Mãe moldou o barro em pequenas partículas, deu-lhes o sopro da vida e vaticinou:
- Evoluam, minhas filhas!

quarta-feira, maio 20, 2015

Enquanto há o medo

Enquanto há o medo 
(História de um dueto inusitado)


Johann Gottfried Müthel podia ser assim por ter tido o pai como o seu primeiro professor; por, já aos dezenove anos de idade, ter sido organista da corte e cravista pessoal de Christian Ludwig II, o Duque de Mecklenburg-Schwerin; ou ainda, por ter sido o último aluno de Johann Sebastian Bach; por ser considerado o melhor executante de clavicórdio de sua época; ou, ainda mais, por estar vivendo em Riga, nos confins do Império Russo, tão longe dos centros musicais em voga na Europa. Porém, ele era assim porque era. Vai-se lá saber o motivo. Era assim! Tinha muito mau feitio. Se bem que o seu temperamento e seu comportamento extravagante não eram de se estranhar por serem tão comuns à maioria dos virtuosos. 

Pois, por vingança filial, vaidade profissional, orgulho do aprendizado ou raiva do destino, o fato é que ele era muito rigoroso nos contratos artísticos. Uma de suas exigências era a de silêncio absoluto em suas apresentações públicas e por isso só se apresentava quando havia neve, o que fazia com que um concerto seu fosse quase uma impossibilidade e a audiência fosse ainda mais reduzida já que com a neve aumentam as constipações. 

Para que este caso se sucedesse, três personagens tem que entrar na história: Marie-Alix, uma poeta de terras de França e, anônimos, dois noviços. Os dois religiosos exerciam as funções de sineiros do grande campanário da grande igreja da pequena aldeia onde o caso se passou. Um deles só queria saber das guloseimas convençais; o outro, o magro, só pensava no dia em que teria autorização para tocar o carrilhão. Quanto à poeta, esta caiu nas graças do alcaide que tudo fazia para agradar a visitante que lá estava de passagem e manifestara o desejo de ouvir o famoso clavicordista. 

Assim foi. O alcaide mandou vir de Riga, a peso de ouro, o talentoso músico. Mas o tempo também tem os seus caprichos. Naquela noite, a neve teimava em não cair. O desespero do alcaide só cessou quando soube que em um povoado serrano, a menos de meia légua dali, as ruas já estavam atapetadas de branco. 

Um concerto de clavicórdio é um exercício também para a audiência, que grande esforço há que fazer para sentir todas as nuances do instrumento. O ouvinte se cansa quase tanto quanto o músico que tem que ter muita concentração e destreza para oferecer todos os harmônicos e vibratos que compensam os esforços dos dois lados. 

Uma carruagem desgovernada adentra a aldeia. Todos os passageiros estão mortos. Prontamente exige-se que o sino toque a rebate. Pela precariedade da velha corda ou pelos quilos a mais do noviço que gostava de doces, o sino não chegou a dar três ou quatro badaladas. O magro, que se magoou menos com a queda, rapidamente correu para o teclado do carrilhão. Porém, não desatou a tocá-lo apenas para chamar a atenção da população. Era o seu tão sonhado momento. Fez sim um grito de alerta. Angustiante. Tenso. Mas musical. 

O músico, impassível, deixa de tocar a sua obra para responder à melodia que o vento lhe trazia de longe. Porém, sinos àquela hora da noite, não importava se harmônicos ou não, eram sinal de perigo. O alcaide foi o primeiro a abandonar o recinto, levando junto a sua hóspede, que saiu arrastada, pois, como artista que era, não queria perder a poesia daquele encontro dos extremos. Debandada geral. O improviso musical durou quase toda a noite, enquanto cada um tratava de si. Da audiência, apenas ficou para ouvir tão desconcertante concerto, o Cristiano Holtz, que foi quem me contou a história.

(Publicado no número 12 da Revista Via Latina, da Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra.

quarta-feira, maio 06, 2015

Daimónico à solta

Cantiga de escárnio e mal dizer com um pocochinho de humor negro sobre as batatas transgénicas, por Filomena Cabral, Isabel Figueiredo e eu, que começou com o mote “Mortalhas de couratos e lombinhos de papelão” 

Tais batatas, diz Bruxelas
São para dar aos suínos
E para fazer papel
Ora, o porco a gente come
E o papel também se fuma
Mas com tanta transgenia
Não demora muito tempo
A gente inverte a fasquia

Se o porco a gente come
Apesar da transgenia
Um dia há-de chegar
Em que o bicho grunhirá:
"Poupa-me, sou tua tia!"

Se o bichinho é minha tia
Não lhe vou passar a faca
Com prazer, isto faria
A uns certos filhos de vaca.

Misturados à manada
Não há sorte que nos valha.
Ainda que rejeitemos
Tais lombinhos guarnecidos
De couvinhas de Bruxelas,
Ninguém nos livrará - ó bichos -
De usar a mesma gamela!

SUKIAKI É O...

SUKIAKI É O…

Versão Tejo bar da música “Ue o Muite Arukou”, de Rokusuke Ei/Hachidai Nakamura que fez grande sucesso mundial na década de 60 e ficou internacionalmente conhecida pelo título dado pelo mercado estadunidense que na dificuldade(?) de falar o nome original, chamou-a de Sukiaki, que é um nome de comida e nada tem a ver com o original.

Você vai caminhando
Sempre a olhar o céu
P’ra não deixar
Rastro do choro
Pelo chão onde pisou
Isso é ilusão
Abre o coração
Olha p’ra frente. Já passou

Se ela não o quer
Esquece essa ingrata
Siga o seu caminho
Vá comer pastéis de nata

Você vai caminhando
Sempre a olhar o céu
P’ra não mostrar
Que nessa história
Você ficou tão “down”
Deixa de bobagen
Faça uma viagem
Ou vá comer um bacalhau

Se ela não o quer
Deixe lá, cague nisso
Siga o seu caminho
Vá comer pão com chouriço

Se ela não o quer
E você sentiu o baque
Siga o seu caminho
Vá comer um Sukiaki

Se ela não o quer
E você ficou na mão
Encha a sua pança
Vá-se embora p’ro Japão

Ue o Muite
Arukou
Namida ga
Koborenai yoni
Omoidasu
Haru no hi
Hitoribotchi no Yoru

quarta-feira, abril 08, 2015

Jardim Kafkiano/Swingreen

Jardim Kafkiano

Tempos atrás, observei que o manacá andava a roubar o cheiro das flores da laranjeira. Não me incomodei muito, pois poderia ser algum tipo de mimetismo odorífero ou simples impressão minha. Depois descobri que as laranjas na nova safra tinha o gosto das mexericas. Fiquei mais atento e comecei a perceber que a mexeriqueira está tomando a forma da touceira de bambu, como mostra a foto (quem quiser comprovar os outros dois fenômenos é só aparecer cá por casa). Eu desconheço a Botânica e não sei se tem a ver com o espaço reduzido do jardim ou se trata de algum tipo de Mensalão vegetal. 
Jorge Carlos



Swingreen...

Manacá apaixonou-se
pelo olor da laranjeira.
Ficou no cheira e não cheira...
Numa noite transmudou-se
e roubou cheiro agridoce.
Não se fez, pois, de rogada
a laranjeira roubada;
tentou ver como é que fica
com sabor da mexerica
de bambu já disfarçada...

Ronaldo Rhusso

segunda-feira, março 30, 2015

sábado, fevereiro 21, 2015

Um...

Um... 
Dois
Dois uns
Com dois, três
Na sequência, cinco
Fiz oito e mereço um... biscoito

(A Marcos Flávio, meu primo poeta, que anda às voltas com o FIB) 


Tu
és
de fato
impagável!
Mereces biscoito
meu muito querido Mané

Ronaldo Rhusso

terça-feira, fevereiro 10, 2015

Reflexões quase vagabundas

Uma poeta chamada Iza.
Essa sim, é poet’Iza.

À sombra de um chaparro ou à beira de um igarapé:
Às vezes, a gente erra; e, muito menos vezes, se acerta.

Algarvias:
Medronho, dá um porre medonho.

Queria, como Pessoa, poder dizer que a minha pátria é minha língua, mas eu a maltrato muito. Portanto, digo: Minha pátria é o que piso.

“Quem canta, seus males espanta”
Não sendo o pulmão ou garganta.

Quem canta mal, espanta os vizinhos.

A ideia é fixa, os delírios tremem

Cavalo sem asas não vai a lado nenhum.

Moleque do avesso anda sem camisa.

Amor é muito bom, mas amor com sexo é bem melhor.

domingo, janeiro 04, 2015

Água ou vinho

Ao saber que o vinho seria pouco para tantos convidados, Jesus pediu que enchessem as taças com a água da cacimba que, mesmo salobra e um pouco barrenta, logo se transformou em bom vinho. Tomé reparou no copo de Jesus e disse:
- O Mestre não mexeu na sua água ou muito me engano?

- É branco! – disse Jesus, baixinho – Vai bem melhor com o peixe.