segunda-feira, outubro 15, 2018

Era que não era de Aquarius


Corria a década de 1970. Meio aos anos duros da Ditadura Militar surgiu o Projeto Aquarius, idealizado pelo jornalista Roberto Marinho e pelo maestro Isaac Karabtchevsky que, à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira, procurava popularizar a boa música. Em Brasília, a apresentação estava programada para o Ginásio Coberto que, sabia-se de antemão iria lotar, não só por ser com entrada franca e pela divulgação maciça dos meios de comunicação, mas pela carência de divertimento do povo das cidades satélites ao Plano Piloto da Capital, que tanto quanto os bairros de lata que a abastecia de mão de obra, também sofria da carência dos grandes espetáculos que se concentravam no eixo Rio-São Paulo.

Fui cedo para pegar lugar. Circundando o Ginásio, vários canhões de 105 mm apontavam suas bocas para a grande multidão que descia dos coletivos que vinham da Ceilândia, Taguatinga, Gama, Núcleo Bandeirante, Guará...  Hum...

Consegui um folheto com a relação das músicas e lá constava a Abertura 1812, de Tchaikovsky, mas andava tão escaldado que não percebi de vez que os tais canhões fariam parte da execução da Abertura, que o próprio compositor não conseguiu executá-la como imaginara. Só me atinei quando a arquibancada tremia sob os ribombos e tive que ajudar a procurar fazer com que o povo prestasse atenção aos alto-falantes que tentavam evitar uma tragédia.

Hoje, de qualquer forma, prestem bem atenção aos canhões. Podem não fazer parte do espetáculo.

(A ilustração, não sei de quem é a autoria.)

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